segunda-feira, 26 de setembro de 2011

tardam-nos os séculos na poesia






a tarde vai e vem no seu   andar antigo
o  corpo de terra e cal
demora-se  no lento vapor das sombras
& tudo é outra coisa –
o silêncio de que sou feita
os limites fixos a que eu desobedeço
o vomito da ordem ao dobrar a esquina
a corda tensa dos códigos onde se  morre  de surdez
os vocábulos que se refugiam no poema
os quartos vazios onde as paredes  gritam
& nós  tão subterrâneos
gememos ladrilhos nas ruas
& de hora em hora somos espelhos quebrados contra o tempo
o sangue é a cor do enigma
das letras pintadas no papel

a felicidade muda  entre a  incandescência das paredes gastas
somos cansados  gnomos do tempo
pedaços minúsculos de gente  a esfarrapar-se contra a miséria
tardam-nos os séculos na poesia
a loucura ri do engano
a mão esquece o encontro da outra mão
a boca  continua a polir metais  caídos  ao som de qualquer ideia
 tudo se converte noutra coisa
 a casa está vazia
& eu continuo criança  profunda & perdida



maria andersen

1 comentário:

  1. também o poema é «contra o tempo», permite o não-esquecimento, a expressão de dores e vazios que todos sentimos.

    abraço.

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